quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Estamos sempre a espera de algo

O que aconteceu comigo hoje merece um post. E é por isso que vou colocar aqui na íntegra o que escrevi no meu diário.

Quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014
13h40
Aeroporto Charles de Gaulle

Se tem uma coisa que todo ser humano vivencia é a experiência de esperar. 
Constantemente esperamos algo em nossas vidas. Agora que estou em um aeroporto esperando meu voo que fui parar para pensar nisso. Talvez porque já esteja aqui há horas fazendo nada a não ser esperar. Mas, espera um instante. Isso não quer dizer que passei esse tempo fazendo nada. Eu busquei distrações. Assisti ao último episódio lançado de Pretty Little Liars, dei uma lida na matéria de Economia Internacional, comi biscoitos, ouvi música, olhei as revistas e livros na Relay, comi uma baguette. Não necessariamente nessa ordem. E agora, aqui estou, escrevendo. 

Só que eu parei para pensar em outras esperas não tão óbvias da vida - não tão evidentes. Quero dizer, estamos sempre esperando algo. Antes de começar o intercâmbio, foi um tempo de espera. Então, desde quando tomei minha decisão, em novembro de 2012, até tudo começar pra valer, em primeiro de janeiro desse ano, eu busquei distrações. 

Procurei informações na internet sobre a França, estudei francês, pesquisei pontos turísticos, opiniões de quem já passou por isso, etc.

Mas, será que tudo que vivi nesse tempo não passou de uma distração?

Será que pensei tanto no que estava para acontecer que deixei de viver nesse período de corpo inteiro? 

Não, claro que não.

Assim, não podemos esperar o que vai nos acontecer como se nossa vida estivesse lá na frente. Não posso pensar que só vou começar a me divertir quando encontrar o Lucas em Frankfurt. Tenho que curtir o aqui e agora. Porque esse é um tempo que não volta. E se não souber bem aproveitá-lo então vou me arrepender depois. As distrações não precisam ser uma obrigação. Elas podem ser prazerosas, tanto quanto aquilo que tanto aguardamos. É como Dumbledore diz, "não vale a pena viver sonhando e esquecer de viver". 

E já são 14h.

Tenho mais uma hora antes do embarque. O que eu espero? Aproveitar cada segundo dela.

16h55
Ainda no Aeroporto

Pois é. Perdi o avião. Você acredita? Eu também não. Estava tudo certo. Cheguei com horas de antecedência. Estava ansiosa. Só fui passar pela esteira às 15h. Porque vi que era a hora do embarque. É a minha primeira vez andando de avião sozinha. E estamos falando de mim. Então é óbvio que tinha que estragar tudo. Claro que ia dar errado. Mas, sinceramente, não sabia que podia entrar antes. O que aconteceu? Bem, minha mala de mão estava muito pesada. Por causa dos quilos a mais, tive que voltar pro check in. Paguei 30 euros para despachar a mala. Voltei para a esteira. Tirei casaco, bota, e minha mochila levou anos para ser liberada. Então peguei minhas coisas e fui para o portão de embarque. A ingênua não estranhou o fato de faltar apenas cinco minutos para o avião decolar e o ambiente estar totalmente vazio. 

Nenhum funcionário ou passageiro. Ok.

Comecei a estranhar. Não sou tão burra assim. Ai, isso é tão humilhante. Pude sentir minhas bochechas encarnando. Meu coração batendo mais rápido e minhas mãos começarem a suar. Não queria acreditar. Afinal, ainda faltavam três minutos. Mas estava ali escrito: embarque fechado. CLOSED.

Pensei: não é possível. Fui buscar ajuda ainda com um pouco de esperança. Correndo pelo aeroporto, me sentindo esganada, chorando sem perceber, foi somente às 15h30, o horário do meu voo, com o funcionário olhando pra mim e falando que já era tarde, que eu fui acreditar. 

Ali passou a ser uma verdade para mim: perdi o avião. Nunca imaginei que isso fosse acontecer. Fiquei sem chão. Não via mais pessoas. Via borrões. Era como se tivessem tirado meus óculos. Depois de muito desespero, principalmente com minha pobre mala querida, que contem meu laptop, acabei sabendo que a mala ainda está aqui no aeroporto. Me disseram que ela sairá no mesmo avião que eu sair. 

Só espero que dê certo. Comprei outra passagem. O próximo voo é às 20h15. 

Pois é. Aí está um dos problemas em se esperar muito por algo. 

Por mais certo que possa parecer, ainda assim pode dar errado. Não é porque esperamos algo que isso vá acontecer. O certo então é não esperar por nada, ou esperar por tudo ao mesmo tempo. O que de uma forma ou de outra, não deixa de ser a mesma coisa. 

Enquanto chorava sentada aqui no banco do aeroporto, um homem se aproximou de mim. Primeiro ele falava em inglês, mas depois não sei o porquê mudou para o francês. E não sei muito menos o porquê eu entendi tão bem o que ele disse. Falou pra mim que na vida uma hora a gente ganha, e em outra a gente perde. Na vida tem coisas que valem muito mais do que 300 euros - sim, tive que pagar quase isso pelas minhas passagens perdidas. Mas ele então disse que há muita coisa pior nessa vida. Ele, por exemplo, perdeu a mãe. E aí me disse que essa perda é muito pior. Não valia a pena eu ficar daquele jeito. Eu nem tinha reparado, mas aí vi que ele tinha um gatinho branco dentro de uma bolsa. E antes de sair, disse ele, o gatinho valia muito mais do que 300 euros. Falou mais alguma coisa que não entendi e foi embora. 

Depois disso eu só pude ficar grata por uma pessoa dessa aparecer na minha frente e dizer exatamente o que eu precisava ouvir. 

Quero dizer, em um dos principais aeroportos do mundo, onde as pessoas estão tão centradas em seus próprios destinos, histórias e esperas, essa pessoas se aproximou para me trazer conforto.

Além de gratidão, também senti um pouco de vergonha pelo meu comportamento exagerado. Afinal, claro que quero ver o Lucas logo, mas isso não quer dizer que não vai acontecer. Só foi adiado. E me deu mais coisas para pensar. 

Quando esperamos muito por algo, é preciso ter cuidado para não ficarmos obcecados. A obsessão pode nos levar para um caminho tortuoso. 

O dia, contudo, não foi completamente ruim. Eu realmente consegui aproveitar as horas que passei aqui. É evidente que não esperava passar mais quatro horas. Só que a vida é assim. Ainda espero ver o Lucas hoje. O que são algumas horas a mais e alguns euros a menos? 

Isso não me impede de aproveitar um tempo que é nosso. E isso ninguém pode nos tirar. Nosso amor não tem preço ou hora marcada. É constante. 

São 17h30, mas já vou ficar perto do portão de embarque. Acho que será melhor. 

19h - Ainda no aeroporto

Isso é o que pode ser chamado de um longo dia. E o que eu aprendi é a ter cuidado com os medos da gente. Em algumas situações, sentir medo é bom e até aceitável, mas essa viagem me preocupou mais do que o necessário. Devia ter ido de trem? Não sei. De certo modo, os erros de hoje me ensinaram muita coisa. Como outras vezes eu já perdi a hora de manhã, na noite passada eu nem dormi direito. Coloquei meus mil despertadores, como de costume, acordei na hora, e tudo correu bem. Quis fazer tudo com calma porque tive medo de perder o avião. Cheguei ao aeroporto às 10h, para um voo que era somente às 15h30. Tive tanto medo de perder o avião, que acabei perdendo. Às vezes os medos nos ajudam, só que outras vezes eles podem ficar tanto na nossa mente, que esquecemos o que queríamos e nos concentramos apenas no medo. E isso não é bom. 

Não posso deixar meus medos me dominarem. Preciso agir por mim mesma.

Estão tão cansada agora. Sinto dor nos meus olhos. Gostaria muito de dormir agora. Falta praticamente meia hora para embarcar. 

Por mais que meu livro novo seja maravilhoso, não consigo mais ler. Meus olhos estão muito cansados. 

Estou ouvindo música e escrevendo aqui. Mas agora, não sei nem ao menos em que pensar. 

Um homem do meu lado parecia estar rezando. Talvez seja muçulmano, porque ele fazia referências. Agora ele já levantou e foi embora. 

Não quero me preocupar tanto com minha mala. Todos os funcionários me disseram que eu precisava fazer nada. 

Me disseram que minha mala ainda estava aqui porque eu estava aqui. E que ela só sairia depois que estivesse confirmado que eu estivesse no avião. 

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Foi isso. A mala veio, estou no hotel, e graças a Deus está tudo na mais perfeita ordem.

Até a próxima :)

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